Saturday, April 15, 2006

a primeira entrevista a gente nunca esquece

Cantor e compositor de Niterói já teve músicas gravadas por Cássia Eller


Eu não sou marginal, sou um bom rapaz, pô!


Existe um grupo de compositores de Niterói que formam um novo movimento da música brasileira, pela identidade criada entre eles. São artistas que estão há mais de uma década na estrada e merecem destaque pela qualidade musical e tino poético. Apesar de suas canções serem gravadas por nomes conhecidos da MPB, como Daúde, Cássia Eller, Pedro Luís e Wado, continuam se apresentando em um cenário alternativo.
Luís Capucho, 44, escritor e compositor é tido como mestre (mesmo que negue o título) desta geração.
Gravou o disco chamado Lua Singela, lançado pelo selo independente Astronauta Discos e é autor do romance despudorado Cinema Orly, lançado pela Editora Interlúdio.
Capucho está preparando um novo disco, ainda sem previsão de lançamento, e se anima quando fala sobre seus novos projetos.

Seu primeiro disco só saiu em 2003, porém tua história como músico começa bem antes disso. Como foi sua carreira até o lançamento do Lua Singela?

Luís Capucho: Assim que comecei a fazer música, mais ou menos aos 23 anos, não via nada de especial nisso, porque era um troço tão espontâneo, que eu achava que qualquer pessoa que se metesse a aprender um instrumento, poderia inventá-las, e era o que eu fazia. Depois, eu comecei a ficar muito crítico com minhas letras, e fui pegando letras de amigos. Meu primeiro parceiro foi o Marcos Sacramento, que me apresentou a Suely Mesquita, que me apresentou a Mathilda Kóvak. Esses são os meus principais parceiros.
Meus outros amigos cantores começaram a curtir interpretar minhas músicas e fui vendo que fazia um troço legal.
Mas eu também adoro cantar e apesar de morrer de timidez, me atrevia a isso, fazia shows esporádicos.
Esse negócio de se assumir, enquanto artista, é um negócio muito difícil. Sou muito inseguro e por isso me transformei em professor de português. De quando em vez, armava um show pra fazer. Comecei a ficar conhecido no circuito underground do Rio. E aí, entrei em coma e tive sequelas vocais e motoras que atingiram em cheio a minha música: fiquei restrito a poucos acordes e minha voz ficou rouca e mais grave. Então, escrevi o Cinema Orly. Depois, quis fazer um show, porque tinha ficado muito interessante. Eu achei a voz e os acordes e a minha batida esquisita no violão. Chamei uns músicos amigos que toparam fazer. Não era loucura minha. Estávamos todos loucos!
O Paulo Baiano (produtor do disco Lua Singela) viu o show com uma cara esquisitíssima e depois de um tempo me chamou pra fazer um disco. E o selo Astronauta Discos lançou.

Um disco pronto, suas canções já gravadas por nomes do mainstream musical, boas críticas sobre o disco e shows escritas por jornalistas como Tárik de Souza (crítico de música do Jornal do Brasil), compositores contemporâneos o chamam de mestre de sua geração... Já pintou alguma negociação com uma grande gravadora?

L.C.: Esse negócio de ter saído no jornal que sou um mestre, isso é maluquice! Mestre nada! Isso é maluquice do Antônio Carlos Miguel, do Globo! Bem que eu gostaria de ser um tipo fodão, assim...(risos)
Não, nunca me agenciei a uma grande empresa. Meus produtos artísticos não entram em cheio no mercado por causa disso. O selo do Lua Singela não tem grana pra investir, assim como a editora de meu livro Cinema Orly. E eu, perdido aqui no meu cotidiano, de vez em quando perco a noção, e brigo pra caramba com eles. Mas eu sei que é complicado. É que eu saí de um coma, quer dizer, eu saí do nada para a minha vida de artista. Eu venho no maior pique e quero uma força que eles não têm. Não sei se me faço entender. Nem eu mesmo entendo muito bem como as coisas se dão. O fato é que estou animado, que eu tenho os produtos de arte e que são legais.
Mesmo que eu não tenha tido nunca dinheiro pra investir, eles, aos poucos, com a força própria que possuem, seguem o bom caminho. É o caso de "Maluca", "Máquina de Escrever", do "Cinema Orly" e tudo.

Nota: "Maluca" foi gravada por Cássia Eller, "Máquina de Escrever" é sua canção de grande sucesso, gravada por Mathilda Kóvak e Pedro Luís. "Cinema Orly", o livro, ficou em evidência na mídia na época do lançamento e foi premiado ano passado pelo grupo gay Arco-Íris.

Tárik de Souza escreve que você faz o avesso da "mpb-boa-moça", você é tido como um maldito e o cabeça desta geração que já foi chamada de "Retropicalismo". Qual a sua relação com este cenário 'marginal'?

L.C.: Não sou o cabeça do Retropicalismo. Quem inventou o Retropicalismo foi a Mathilda Kóvak e me colocou nele como um Jean Genet da MPB. Eu não sou marginal, sou um bom rapaz, pô! Ninguém deve saber o que seja o Retropicalismo, nem mesmo a Mathilda que o inventou. Não sou um intelectual. O Tropicalismo foi uma música feita por intelectuais de classe média em contra-ponto à Jovem-Guarda, que era uma música mais fácil de ser assimilada. Por muito tempo estive mais para Roberto Carlos que para Caetano Veloso. Por acaso estudei letras, e fiz um livro, e sou um artista, finalmente, eu assumo isso. Mas queria que você perguntasse à Mathilda, que troço é esse de Retropicalismo...(risos)

Nota (2): Mathilda Kóvak em um release chama Luís Capucho de Jean Genet da canção popular. Jean Genet é dramaturgo francês (1910-1986), amigo de grandes mentes de seu tempo como Sartre, Derrida e Foucault. Também teve grande importância ao descrever de maneira muito objetiva o submundo gay.

Suas parcerias são com compositoras que também estão neste cenário alternativo, como Mathilda Kóvak, Suely Mesquita e Suzie Thompson. Você poderia me contar um pouco sobre este grupo que de certa maneira já criou um novo movimento na música popular brasileira?

L.C.: A gente tem mesmo uma identidade, a gente se reconhece nas músicas um dos outros e, por isso, nos tornamos parceiros.
Suely e Mathilda são mais articuladas, e articuladoras, e essa idéia de grupo, que extrapola nossa cidade (Niterói), se deve às suas maquinações e ao fato de sermos amigos. É um grupo feminino, do qual herdei o meu "Blog rosa". Agora, inventei um "Blog azul", e estamos num outro momento, cada um fazendo suas coisas no seu canto, embora sem perder um ao outro, porque, juntos, criamos um vínculo bem legal nesses muitos anos em que nos conhecemos.
Eu adoro quando inventamos de estar juntos num projeto qualquer musical. Gosto de turma! Ficamos mais fortes e protegidos, além de ficar mais bonito. Vamos ver qual vai ser a próxima!

Você gostou das gravações dos outros intérpretes? Tem alguma predileta? Qual a importância de ter suas canções na voz de outras pessoas?

L.C.: Eu adoro que minha música seja cantada por um intérprete ou outra pessoa. Isso é muito importante, porque como eu sou muito inseguro quanto ao que faço, fico na dúvida se está bom, se um cara canta, sei que ficou legal. Às vezes, uma música só está legal pra mim, se alguém gostou. O gosto do outro é o meu parâmetro. É foda! Eu adoro a "Maluca" com a Cássia Eller! E "Máquina de Escrever" com a Mathilda!

E quais os projetos futuros? Composições novas, alguma gravação pintando por aí?

L.C.: Estou muito animado! Quarta-feira, agora (12/04/2006), estarei indo para Curitiba para gravar as bases de meu novo CD. Não tenho selo, nada. Vou fazendo aos pouquinhos e ajeitando. O Chico César ofereceu seu selo para lançar, mas ainda não conversamos direito sobre isso.
Quero regravar "Romena"?, parceria com a Suely, que a Daúde gravou. E quero regravar Auréola, parceria com Mathilda e que ela e eu gravamos no "Mahatmathilda, A Evolução de Minha Espécie". Todas as outras músicas serão inéditas.
Além disso, "Máquina de Escrever" entrou na trilha de um filme a ser lançado ainda esse ano pelo Grupo "Nós no Morro", um filme que irá se chamar "Show de Bola".
Estarei cantando "Fonemas", minha parceria com Marcos Sacramento, num documentário do "Cep 20000", sobre eles mesmos.
E sou um dos documentados por Bruno Barreto no documentário sobre a FLIP, Feira Literária Internacional de Paraty, como escritor do Cinema Orly.
Fui selecionado para me apresentar na Sala Funarte, na Pauta Brasileira de Música, onde se apresentarão também os meus parceiros Marcos Sacramento e Suely Mesquita.

Nota (3):
Chico César, cantor e compositor tem o selo Chita Discos. "Nós no Morro" é o projeto de um grupo de amigos que trabalha com a Comunidade do Vidigal, no Rio de Janeiro, formando grupos de teatro desde 1986 e em 1995 iniciaram trabalhos em cinema. "Cep 20000" é um Centro de Experimentação Poética.




Luís Capucho, Mathilda Kóvak e Pedro Luís


Para mais informações sobre Luís Capucho visite o site clicando aqui.

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